domingo, 22 de março de 2015

Resumo do Capítulo 2 (Lições Preliminares de Direito - Miguel Reale): O Direito e as Ciências Afins


Faz-se mister verificar quais as ligações do Direito, os seus nexos com outras ordens de conhecimento, especialmente com a Filosofia do Direito, a Teoria Geral do Direito e a Sociologia do Direito

a) Noção de Filosofia do Direito

“Filosofia” é uma palavra de origem grega, de philos (amizade, amor) e sophia (ciência, sabedoria). Filósofo não é o senhor de todas as verdades, mas apenas um fiel amigo do saber. A amizade significa a dedicação de um ser humano a outro, sem qualquer interesse, com sentido de permanência, de perenidade. Amizade constitui-se um laço permanente de dedicação. A “Filosofia”, portanto, poderia ser vista, de início, como dedicação desinteressada e constante ao bem e à verdade: dedicar-se ao conhecimento, de maneira permanente e não ocasional, sem visar intencionalmente a qualquer escopo prático ou utilitário, eis a condição primordial de todo e qualquer conhecimento filosófico.
No que se refere propriamente à Filosofia do Direito, seria ela uma perquirição permanente e desinteressada das condições morais, lógicas e históricas do fenômeno jurídico e da Ciência do Direito. O Direito é um fenômeno histórico-social sempre sujeito a variações e intercorrências, fluxos e refluxos no espaço e no tempo.
Se resumirmos os tipos de indagações formuladas, chegaremos a três ordens de pesquisas, a que a Filosofia do Direito responde: Que é Direito? Em que se funda ou se legitima o Direito? Qual o sentido da história do Direito?
Em conclusão, o filósofo do Direito indaga dos princípios lógicos, éticos e histórico-culturais do Direito.

b) Noção de Ciência do Direito

A Ciência do Direito, ou Jurisprudência – tomada esta palavra na sua acepção clássica - , tem por objeto o fenômeno jurídico tal como ele se encontra historicamente realizada.
A Ciência do Direito é sempre ciência de um Direito positivo, isto é, positivado no espaço e no tempo, como experiência efetiva, passada ou atual. Assim é que o Direito dos gregos antigos pode ser objeto de ciência, tanto como o da Grécia de nossos dias. Não há Ciência do Direito em abstrato, isto é, sem referência direta a um campo de experiência social.
Será essa referibilidade imediata à experiência a nota caracterizadora de uma investigação jurídica de natureza científico-positiva. Donde pode-se dizer que a ciência do Direito é uma forma de conhecimento positivo da realidade social segundo normas ou regras objetivadas, ou seja, tornadas objetivas, no decurso do processo histórico.
O Direito Positivo é o Direito que, em algum momento histórico, entrou em vigor, teve ou continua tendo eficácia.

c) Noção de Teoria Geral do Direito

A Ciência jurídica não fica circunscrita à análise destes ou daqueles quadros particulares de normas, mas procura estrutura-los segundo princípios ou conceitos gerais unificadores.
“Teoria”, do grego theoresis, significa a conversão de um assunto em problema, sujeito a indagação e pesquisa, a fim de superar a particularidade dos casos isolados, para englobá-los numa forma de compreensão, que correlacione entre si as partes e o todo. Já Aristóteles nos ensinava que não há ciência senão do genérico.
Para que se eleve ao plano de uma Teoria Geral do Direito, a Ciência Jurídica se elava representando a parte geral comum a todas as formas de conhecimento positivo do Direito, aquela na qual se fixam os princípios ou diretrizes capazes de elucidar-nos sobre a estrutura das regras jurídicas e sua concatenação lógica, bem como sobre os motivos que governam os distintos campos da experiência jurídica.
Alguns autores distinguem entre Teoria Geral do Direito e Enciclopédia Jurídica, atribuindo a esta a tarefa de elaborar uma súmula de cada uma das disciplinas do Direito, numa espécie de microcosmo jurídico.
Parece-nos de bem reduzido alcance esse cinerama jurídico. É à introdução ao Estudo do Direito que cabe, a nosso ver, dar uma noção geral de cada disciplina jurídica, mas sem a pretensão de realizar uma síntese das respectivas questões fundamentais.

d) Direito e Sociologia

Em linhas gerais, porém, pode-se dizer que a Sociologia tem por fim o estudo do fato social na estrutura e funcionalidade, para saber, em suma, como os grupos humanos se organizam e se desenvolvem, em função dos múltiplos fatores que atuam sobre as formas de convivência.
A Sociologia tem por objetivo verificar como a vida social comporta diversos tipos de regras, como reagem em relação a elas, nestas ou naquelas circunstâncias etc.
Hoje em dia, a Sociologia, sem perder o seu caráter de pesquisa global ou sistemática do fato social enquanto social, achega-se mais à realidade, sem a preocupação de atingir formas puras ou arquetípicas. Desenvolve-se antes como investigação das estruturas do fato social, inseparáveis de sua funcionalidade concreta, sem considerar acessórios ou secundários os “estudos de campo”, relativos a áreas delimitadas da experiência social.
A Sociologia Jurídica apresenta-se, hodiernamente, como uma ciência positiva que procura se valer de rigorosos dados estatísticos para compreender como as normas jurídicas se apresentam efetivamente, isto é, como experiência humana, com resultados que não raro se mostram bem diversos dos que eram esperados pelo legislador. A Sociologia Jurídica não vis à norma jurídica como tal, mas sim à sua eficácia ou efetividade, no plano do fato social.
Desnecessário é encarecer a importância da Sociologia do Direito para o jurista ou para o legislador. Se ela não tem finalidade normativa, no sentido de instaurar modelos de organização e de conduta, as suas conclusões são indispensáveis a quem tenha a missão de modelar os comportamentos humanos, para considera-los lícitos ou ilícitos.

e) Direito e Economia.

Entre os fins motivadores da conduta humana destacam-se os relativos à nossa própria subsistência e conservação, tendo as exigências vitais evidente caráter prioritário.
A regra é a satisfação primordial dos interesses relacionados com a vida e o seu desenvolvimento.
Esse tipo de ação, orientada no sentido da produção e distribuição de bens indispensáveis ou úteis à vida coletiva, é a razão de ser da Economia.
Segundo o materialismo histórico, o Direito não seria senão uma superestrutura, de caráter ideológico, condicionado pela infra-estrutura econômica. É esta que, no dizer de Marx, modela a sociedade, determinando as formas de Arte, de Moral ou de Direito, em função da vontade da classe detentora dos meios de produção. Quem comanda as forças econômicas, através delas plasma o Estado e o Direito, apresentando suas volições em roupagens ideológicas destinadas a disfarçar a realidade dos fatos.
Para Reale, essa teoria peca inclusive do vício lógico de conceber uma estrutura econômica anterior ao Direito e independente dele, quando, na realidade, o Direito está sempre presente, qualquer que seja a ordenação das forças econômicas. Por outro lado, quando uma nova técnica de produção determina a substituição de uma estrutura jurídica por outra, a nova estrutura repercute, por sua vez, sobre a vida econômica, condicionando-a. Para ele, há uma interação constante entre Economia e Direito, não se podendo afirmar que a primeira cause o segundo ou que o Direito seja mera “roupagem ideológica” de uma dada forma de produção.
Para Reale, portanto, há uma interação dialética entre o econômico e o jurídico, não sendo possível reduzir essa relação a nexos causais, nem tampouco a uma relação entre forma e conteúdo.

O Direito, segundo Reale, está cheio de regras que disciplinam atos totalmente indiferentes ou alheios a quaisquer finalidades econômicas. Seria próprio do Direito receber os valores econômicos, artísticos, religosos etc., sujeitando-os às suas próprias estruturas e fins, tornando-os, assim, jurídicos na medida e enquanto os integra em seu ordenamento. 

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