sexta-feira, 17 de abril de 2015

Trechos de Injustiças - Citados por Rizzato Nunes em sua obra Manual de Introdução ao Estudo do Direito.

Citando indiretamente Lenio Streck[1], Rizzatto Nunes traz alguns trechos de decisões que nos deixam atônitos, tendo em vista sua notória injustiça:

a)Um indivíduo foi processado criminalmente porque, na noite de Natal, foi a um baile e pagou o ingresso que custava R$6,00 (seis reais) com um cheque de R$ 60,00 (sessenta reais), que teria sido objeto de furto (essa a acusação).O promotor de Justiça – pasmem! – pediu ao juiz do feito a decretação da prisão preventiva (sic) do acusado. Fazendo voz com Lenio, pedimos ao estudante-leitor para imaginar o “grau de periculosidade” daquela pessoa.Deveríamos, inclusive, perceber o claro interesse público em proteger bailes de Natal desse quilate – e valor: R$6,00!Por sorte o Juiz não decretou a prisão preventiva, mas condenou o réu a 2 anos de reclusão; sentença reformada no Tribunal por falta de provas.

b) Uma pessoa foi presa preventivamente sob a acusação de ter furtado uma garrafa de vinho, alguns metros de mangueira plástica e um facão.
Foi preso e ficou recolhido ao xadrez por mais de 6 meses. Foi absolvido em grau de recurso por falta de provas.
Ficamos assim, nós brasileiros, livres preventivamente, por 6 meses, desse cidadão de tremenda periculosidade. Ainda bem...

c) Outro foi processado pelo crime de estelionato por ter comprado um limpador de para-brisas, pago com cheque de R$ 130,00 e recebido o troco de R$80,00. Segundo a acusação o cheque seria furtado.
Ficou, também, preso preventivamente. Este por dez meses. Foi condenado a 1 ano e 10 meses de reclusão e não pôde recorrer em liberdade. Por isso, como continuava preso, ficou no total encarceramento por 14 meses.
Conclusão: absolvido no Tribunal, por falta de provas.
Como é que essas coisas podem acontecer, sem qualquer responsabilidade aos causadores do dano à pessoa?

d) Dois cidadãos foram condenados a 2 anos de reclusão por terem “subtraído”, das águas de um bucólico açude no interior do Estado do Rio Grande do Sul, novos peixes tipo “traíra”, avaliados em – espantem-se – R$7,50!

e) Uma pessoa ficou presa por ordem da Justiça de Tubarão, Santa Catarina, pelo período de 60 dias, pela acusação de tentativa de furto de uma cédula de R$10,00, que nunca foi encontrada.
Bela decisão esta, a favor da economia e finanças nacionais. Seria cômico se não fosse tão trágica.

f) O ex-Governador do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho, em visita a uma Delegacia de Polícia de seu Estado, flagrou um indivíduo preso sob acusação de ter tentado furtar um aparelho de barbear descartável.
Acrescentamos que devia estar com a barba feita com aparelhos fornecidos pelo Estado...

g) Jaider Lopes dos Reis Lemes, inválido, por intermédio de sua mãe, requereu o benefício que lhe assegura a Constituição Federal (art. 203, V), de um salário mínimo mensal, que à época era de R$120,00.
A lei referida no Texto Constitucional diz que a pessoa inválida pode receber o benefício, desde que a renda per capita da família não exceda 25% do salário mínimo, ou, no caso, R$30,00.
Quando teve início o processo administrativo de Jaider unto ao INSS, seu pai recebia a “polpuda soma” de R$ 169,20 mensais. Com esses R$169,20, o pai de Jaider “sustentava” cinco pessoas, incluindo ele próprio, inválido.
O posto do INSS, tão cioso de suas obrigações e prestador de serviço público essencial, negou o pleito, pois efetuado o cálculo previsto na lei descobriu que 25% do salário do pai de Jader montavam a – assombrosos – R$33,84, acima, portanto, do teto legal. Aliás, muito acima: R$3,84!
A mãe de Jaider recorreu junto à 5ª Junta de Recursos do Distrito Federal e ganhou o benefício.
Contudo, a Divisão de Recursos e Benefícios do Ministério da Previdência – aolha aí nosso cioso serviço público...- recorreu a outra superior instância. A 2ª Coordenadoria de Consultoria Jurídica, por incrível que isto possa parecer, entendeu que: “a família do Autor (...) não é uma família miserável, ou seja, incapaz de prover a manutenção de pessoa portadora de deficiência...” (SIC!)
Os casos acima relatados, apesar da flagrante injustiça perpetuada contra as pessoas, refletem condutas ilegais e/ou fundadas em textos que violam a Constituição Federal, se não em abstrato, com certeza, in concreto, cuja solução tinha de ter sido outra(...)





[1] STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica e(m) crise. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1990 Apud NUNES, Rizzato. Manual de Introdução ao Estudo do Direito. 9 ed. São Paulo: Saraiva, p. 320-321.

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